Piracicaba Nunca Esqueceu
A história das salas de cinema em Piracicaba

Francisco Andia

Resumo da Entrevista com Francisco Andia

Na entrevista realizada em 2021, Francisco Andia, compartilha sua trajetória no cinema e a relação profunda que manteve com a exibição e distribuição de filmes. Ele conta como começou sua jornada no ramo, adquirindo salas de cinema em Piracicaba, incluindo o Cine Colonial, o Cine Palácio (posteriormente renomeado Cine Rivoli), Cine Plaza, e entre outras, além de gerenciar cinemas em outras cidades do interior paulista.

Principais Temas e Histórias

  1. Início no Cinema

    • Sua entrada no ramo aconteceu com a compra do Cine Colonial, em sociedade com Lucidio Serábulo, e depois a aquisição do Cine Palácio. Ele destaca o envolvimento familiar nesses negócios.
  2. Construção do Cine Plaza

    • Ele relembra a construção do Cine Plaza, um cinema de alta qualidade, mas que teve vida curta devido ao desabamento do prédio Comurba, que destruiu o cinema. Ele estava no local durante o incidente e escapou com o pai e um amigo pela tubulação de ar-condicionado.
  3. Relação com o Cinema de Arte

    • Francisco Andia também investiu em exibições de filmes de arte no Politeama e no Cine Arte “Grande Otelo”.
  4. Mudança nos Cinemas e o Fim das Salas de Rua

    • Ele reflete sobre o impacto dos cinemas de shopping, a popularização da televisão e o streaming, que acabaram contribuindo para o declínio das salas de cinema de rua.
  5. Produção e Distribuição

    • Ele teve participação na Roma Filmes, uma distribuidora que chegou a negociar com grandes estúdios e cineastas. Relata, por exemplo, a tentativa de produzir um filme com Sergio Leone, que não se concretizou.
  6. Paixão pelo Cinema

    • Francisco Andia revela que o cinema foi o grande amor de sua vida, destacando seu entusiasmo pelo cuidado com som, projeção e a experiência do espectador. Ele conta como construiu um projetor de madeira aos 12 anos e como essa paixão moldou toda a sua trajetória.
  7. Momentos Marcantes

    • Um dos momentos mais emocionantes foi a avant-première de um filme com a atriz Claudine Auger, realizada em Piracicaba, com a atriz hospedada em sua casa.
    • O desabamento do Cine Plaza também marcou profundamente sua história.

Reflexões sobre o Futuro

Francisco Andia expressa ceticismo quanto ao futuro das salas de cinema físicas, acreditando que o streaming e o consumo doméstico de filmes são tendências irreversíveis. Ainda assim, ele vê o cinema como uma experiência única e insubstituível.

Entrevista completa

00:07 P: Como é que era Piracicaba antes de você trazer os cinemas para cá, né, se havia exibições, como é que funcionava?

00:15 R: Na realidade quem trouxe os cinemas… Vamos ver, você fala cinema produção ou cinema exibição?

00:25 P: Ah, eu acho que exibição principalmente, né? Acho que o forte de Piracicaba sempre foi mais exibição do que produção né?

00:35 R: Exato. Bom, Piracicaba teve o primeiro cinema que eu saiba, chamava-se Cine Íris, e ficava na rua governador. Eu não conheci, ouvi falar, só. Depois, já do meu tempo, tinha o Broadway e o São José, onde é o Clube Coronel Barbosa, sabe lá o teatro São José?

00:59 P: Sim.

00:60 R: Ali era cinema, era o cinema popular, vamos dizer, que se vê seriado, filmes mais populares, Faroeste e o Broadway era o cinema onde depois foi o Tiffany, né.

01:17 P: Sim.

01:18 R: Era um lugar ali da São José, lá. Era um cinema mais, vamos dizer, mais… A classe mais alta, exibia uns filmes melhores e pertencia a Cinemas do Interior de São Paulo, que era do pessoal de São Paulo que era dono da fábrica nacional de vagões… Era Andrade.

01:46 P: Nossa!

01:47 R: É, eles que eram donos dos cinemas, chamava Cinema do Interior de São Paulo.

01:55 P: Ah, que legal!

01:57 R: Aí tinha… Foi inaugurado o Cine Palácio, que você tem aí, que eu mandei pra você do jornal, tudo.

02:04 P: Sim.

02:05 R: E depois o colonial logo em seguida, assim, os dois, os dois ficavam na Benjamin, o cine colonial pertencia a um, que depois tornou-se meu sócio, Lucidio Serábulo que era dono do Marrocos em São Paulo. Por sinal o Marrocos foi fechado que era o cinema mais chique e maior da América Latina.

02:32 P: Caramba! Aqui em Piracicaba ficava?

02:35 R: Não, não. Lá em São Paulo.

02:37 P: Ah, lá em São Paulo.

02:38 R: Na Rua José de Magalhães?, em São Paulo. É um cinema que tinha três balcões, tinha mil e quinhentos lugares, tinha 4 quatro projetores!

02:48 P: Caramba!

02:49 R: Era um cinema sensacional que hoje foi invadido, você lembra o jornal desse dia, na televisão, que foi invadido por sem teto, bom, pertencia ao Lucidio Serábulo e ao Sérgio, que eu não lembro do sobrenome dele e eu como já mexia com cinema, um cinema de… Não produção, mas cinema… Vamos dizer, tinha um desfile no Colégio Piracicabano e eu já filmava, [ruído] o Piracicabano deve ter ainda os filmes que eu fazia em 16mm, quando tinha desfile na época, tinha desfile ou uma festividade lá e eu filmava, e fiquei conhecido do Sérgio que não era do ramo, ele ficava… Não sei como ele ficou sócio do Lucidio Serábulo e eu comprei a parte dele no Colonial.

03:47 P: Ah…

03:48 R: Foi aí que eu comecei a entrar na exibição, então eu fiquei sócio do Lucidio, no [e um?] Colonial. Depois… Os irmãos Cury que eram donos do Cine Palácio quiseram vender e nós compramos, aí entrou a nossa família, seu avô, eu… Minha irmãs, tudo, e compramos a parte, lá… O Cine Palácio e o Lucidio, que era o meu sócio no Colonial também entrou, mas depois ele saiu, então eu fiquei com o Colonial e o Palácio, e eu ia para São Paulo sempre, no escritório que ficava, do Lucidio, que ficava em cima do Cine Marrocos, no prédio.

04:46 P: Nossa, que legal!

04:47 R: Foi lá que começamos, fazia a programação lá e fiquei muito amigo lá do pessoal e tocamos os dois cinemas, o Colonial e o Cine Palácio. Aí surgiu o prédio, lá… Comurba.

05:07 P: Ah, sim…

05:09 R: E do lado do prédio do Comurba, assim, atrás, mas parecia parte conjunto, ali, tinha um terreno, e nós estávamos meio que comprar o Cine, o São José ou comprar o terreno e construir o cinema, e decidimos construir o cinema e construímos o Cine Plaza, que funcionou por dois anos, e depois caiu o prédio do Comurba em cima do cinema e acabou com o cinema, o Plaza era um cinema de categoria, vamos dizer internacional, um cinema excelente, um dos melhores do interior de São Paulo, quase, aí quando caiu o Plaza, reformamos o Palácio.

05:59 P: Ah…

06:01 R: Aí mudei o nome para Cine Rivoli.

06:04 P: Porque houve essa mudança de nome, assim?

06:08 R: Porque na mesma época nós abri- eu abri, junto com mais dois sócios, a importadora e distribuidora, a Roma Filmes em São Paulo, e eu comprava filmes na Itália, muito, da Itália e da França, na época que eu comprava filmes, a Itália produzia 600 filmes por ano.

06:33 P: Nossa!

06:34 R: A época do faroeste espaguete, que eles falavam, né.

06:38 P: Aham!

06:39 R: Tinha muitos filmes bons, não tinha só faroeste, então lá, eu conheci o pessoal de cinema e ia no cinema lá e tinha o cine Rivoli lá, então eu resolvi mudar o nome para Cine Rivoli.

06:55 P: Em homenagem, assim?

06:58 R: É, e ficou muito bonita a reforma, então ficou Rivoli e o Colonial. Em 71, nós compramos o Cinema do Interior, que era do Andrade, aí veio o cine Politeama, o cine Broadway, que depois eu reformei e botei o nome de Tiffany, também porque lá em Roma tinha o cinema Tiffany, e daí, nós ficamos com os cinemas, todos de Piracicaba, de Americana, de Limeira, de Capivari, de Santa Bárbara, e de Nova Odessa, sei que tinha acho que 11 cinemas, ficou a Cinema de Interior, no fim ficamos sócios eu e o irmão do Lucidio, que era o meu primeiro sócio, nós ficamos sócios, e tínhamos também a Roma Filmes em São Paulo, que era distribuidora, que comprava filmes e distribuía.

08:05 P: Distribuía para onde? Pro estado de São Paulo? Para o interior paulista?

08:09 R: Para o Brasil todo e às vezes comprava também para a América do Sul, e depois vendia os direitos para a Venezuela, Colômbia.

08:21 P: Que legal!

08:22 R: E nessa época, na Roma filmes, nós ficamos distribuidores exclusivos da Paramount, na Venezuela. Na Venezuela tinha um pessoal que era sócio lá, que tomava conta. Essa é a parte de São Paulo, né, mas o seu interesse é do cinema do interior.

08:47 P: É, haha, mas eu, vish, eu me empolgo também, acho tudo tão legal.

08:52 R: Então nós tínhamos esses cinemas todos. Piracicaba também tinha o cinema Paulistinha também, um cinema que ficava lá na Pauliceia, era um cinema pequeno, dos irmãos Cassano a propriedade, e nós tocamos o cinema lá. Então tinha o Paulistinha, o Colonial, o Rivoli, o Tiffany e o Politeama, em Piracicaba né. Foi quando abriu o shopping aqui em Piracicaba, que abriram duas salas, que quem pegou foi o dono da Paris Filmes… E continuamos até […] , que era no centro da cidade, que hoje acho que é teatro, hoje. E pegamos os dois cinemas do shopping Limeira, também.

10:04 P: Ah…

10:05 R: No shopping que fica lá na beira da estrada, eu acredito, um shopping [europeu?], o maior shopping de Limeira, que aí depois decaiu muito que abriram um outro shopping no centro da cidade. Daí começaram os cinemas de shopping, os cinemas de rua foram caindo, então aqui, eu vendi o Cine Politeama para o Bradesco [ ], o Tifanny era alugado do [ ] para o Zé Correia, acho que é da família até hoje. O Paulistinha fechou, o Colonial, fechamos, o Rivoli, alugamos para a Igreja Universal, e fomos deixando de lado os cinemas e ficou só a Roma filmes, também aí as coisas foram mudando, na época nós éramos distribuidores em pé de igualdade com a Paris filmes, com a [Combra?] filmes, mas depois o cinema mudou, com a entrada da televisão mais fortemente no cinema, a importação de filme também, a Itália diminuiu drasticamente a produção, que era o nosso forte, a França, alguns filmes, muito pouco, que nós importamos da Inglaterra acho que nada, da Espanha também não, os Estados Unidos fomos para Hollywood para ver se comprávamos alguma coisa, mas ali os americanos… Nada… A Itália nada, na Itália a gente entrava em concorrência com a Paramount e com a Universal para comprar filmes, porque é… Ficava quase, como dizer, quase como um leilão, você comprava filmes de produção, ia no festival de Cannes, por exemplo, tinha os distribuidores, compradores e distribuidores que comprava filme ali em produção, futura produção. Compramos uns dois filmes assim, então você ficava esperando o resultado, se ia sair bom ou não ia sair bom. Nós íamos produzir um filme com o Sérgio Leone, tivemos juntos, almoçamos e vimos de produzir o filme aqui no Brasil com ele.

12:55 P: E não deu certo?

12:57 R: Não deu certo, porque eu seguia … Acabou… O projeto não foi para frente… Mas…

13:07 P: E o que que o cinema de hoje, o cinema de shopping, que que ele tinha que o cinema de rua não tinha? Assim, que os cinemas acabaram fechando…

13:17 R: Primeiro, questão de segurança. Segundo, guardar o carro, você vai no shopping, você estaciona, vai almoçar e vai no cinema, e no mundo inteiro o cinema de rua desapareceram por completo, não existe mais cinema de rua, eu acho que em São Paulo ficou o Cine Art ainda, se não me engano continua na…

13:45 P: Eu acho que ele tá… É.

13:46 R: Eles, a prefeitura entrou no meio lá para ter o Cine Art. Aí nós tivemos também o Cine Art aqui no teatro, nós tínhamos também o Cine Art.

13:57 P: Ah, verdade!

13:58 R: Aliás, foi o último cinema que eu fechei.

14:00 P: Por que?

14:01 R: Por causa de uma inundação teve lá, entrou água em tudo e estragou tudo, eu fechei aquele… Era um cinema mais para ter um cinema, né, da prefeitura, e a gente fazia a programação, a gente procurava uns filmes de arte, tinha dois ou três que nós nos reunimos que era da cultura… Para fazer a programação dos cinemas, os filmes de arte, que geralmente que os cinemas comerciais não se interessavam muito pelos filmes de arte, que eram pouca renda, né, era um público restrito. Então mantivemos o Cine Art até nessa inundação, daí a indução estragou todas as poltronas, estragou tudo, eu falei eu não vou gastar muito dinheiro… Eu mantinha aquilo apenas para dizer que estava no cinema ainda porque o cinema entrou no meu sangue quando eu tinha 10, 12 anos, então uma coisa que… Pra mim foi muito chato ter que sair do cinema, né. Tanto que nunca mais, olha, acho que se eu entrei em cinema umas duas vezes depois que eu saí do ramo, foi muito.

15:20 P: E por que assim ? Mais pelo valor sentimental? Ou…

15:24 R: Não não, porque aí eu assisto filme em casa todos os dias, assisto seriado, filme, eu tenho uma televisão grande, um som bom e tudo, então eu assisto em casa todo santo dia no mínimo uns 2, 3 seriados, filmes, enfim…Eu gosto muito disso, e como eu participei de produção e sei perfeitamente como é feito as cenas, então isso me… Quando eu vejo uma cena, eu sei como é que foi feito, cê entende?

16:06 P: Fica bem mais legal, pelo menos eu acho. Acho que fica tão mais legal você ver um filme e você falar: nossa, olha, eles tiveram essa ideia para fazer essa cena, não sei, eu acho que fica bem mais legal ver um filme quando você sabe como é feito.

16:18 R: Exatamente, às vezes eu vejo um título de filme aqui, acho que ontem mesmo aconteceu isso, eu olhei assim, começou o filme eu falei para a Édna: esse filme não é bom, já percebi que a produção não era boa, não tinha ritmo, não tinha… O roteiro confuso, e era um filme alemão, normalmente filme alemão é difícil ser bom. Alemão, espanhol, com exceção do grande diretor espanhol… Como é que ele chama, esqueci o nome, você sabe quem é o…

17:00 P: Ai, acho que fugiu o nome, também, mas…

17:02 R: Fugiu o nome. Mas, não sabe fazer filme, o alemão não sabe fazer filme, nós assistimos um filme alemão, o enredo era bom, o assunto era bom, mas se fosse feito por americano ou por inglês, tenho certeza que seria 10 vezes melhor. Inglês sabe fazer filme, os americanos sabe fazer filme, o francês, filme de arte. Com raras exceções, tem filme francês bom que não é de arte, mas por exemplo, eu que comprava filme, não interessava comprar filme de arte porque não vendia, então eu procurava filmes que tivesse possibilidade de ser, primeiro de achar um exibidor em São Paulo.

18:01 P: Uhum.

18:02 R: Na época da Roma filmes nós fizemos sociedade com um pessoal de Botucatu, o Emílio Peduti e o… Como é que chama?… Que é dono do cinema daqui do Shopping de Piracicaba?

18:26 P: Não conheço, eu tentei entrar em contato com o…

18:30 R: Era Araújo e Passos, Gilberto Araújo e nós fizemos uma sociedade, era o Gilberto Araújo, o sócio dele, o Emílio Peduti, o Campos que era dono dos cinemas de Santos, e compramos do Livio Bruni do Rio de Janeiro todos os cinemas que ele tinha: São Paulo, Rio, Bahia, Porto Alegre, Curitiba, uma rede grande de cinemas, né, mas a sociedade não foi longe porque um dos sócios, principalmente esse que tem os cinemas daqui, ele era meio louco e fazia umas besteiras lá e eu falei: ó ceis caem foram, ficam com os cinemas e nós com a Roma filmes outra vez, e acabou a nossa sociedade assim, o que mais que você quer saber?

19:33 P: E qual exibição mais te marcou, assim? Foi uma exibição aqui em Piracicaba, foi em São Paulo ou foi em…?

19:45 R: Como me marcou a exibição? A produção, distribuição ou exibição?

19:50 P: É, a exibição, assim, qual mais te marcou?

19:54 R: Bom, a exibição para mim foi muito… Que me marcou mesmo foi o fato de comprar filmes, distribuir e exibir, por exemplo: ¨Um pouco de sol na água fria¨… “Escalation”, não Um Pouco de Sol… Escalation era um filme com a Claudine Auger que eu comprei uma e convidamos ela para fazer a avant-première no Brasil e foi feito aqui em Piracicaba, ela veio aqui em Piracicaba e ficou hospedada na minha casa, e nós fizemos a primeira exibição no Brasil aqui em Piracicaba. Isso foi muito agradável, foi muito interessante, nós depois inclusive tivemos em Paris, que o marido dela, Jacques Deray, era um grande diretor, jantamos juntos, tudo, essa parte era a que eu mais gostava.

21:02 P: A parte mais de socialização, assim?

21:04 R: É. E a exibição sempre foi o que eu mais estive, vamos dizer, ligado. Mas com a produção… Com a produção, não. [Cruzei-nos] um filme nacional que nem lembro o nome, mas a parte de exibição ligada à distribuição e importação, a exibição sempre foi o meu forte, eu gostava de ter o melhor som, a melhor imagem, tudo. Eu entrava no cinema e na hora eu já via, subia na cabine, tá um pouco fora de foco, o som tá muito alto, o som tá muito baixo, e tinha um técnico, Dante Martame que é um gênio em questão de som, um gênio do cinema, tanto é que ele ficou no Rio de Janeiro, no Ribeiro que era dono de todos os cinemas lá no Rio, vários anos, ele ta em São Paulo agora. Não sei, faz tempo que eu não vejo o Dante, mas ele, às vezes nós passava a noite dentro de uma cabine, mexendo no som, melhorando e colocando o alto falante assim ou assado. As novidades que saíam, ele é… Uma capacidade… É um artista.

22:29 P: Sim.

22:30 R: E ele, e ele gostava de mim, porque eu também gostava de cinema. Então não era só a questão dele ganhar dinheiro com o cinema, era… Tava no sangue de você entrar numa sala de projeção e ver uma tela brilhando, no foco e o som de primeira linha.

22:52 P: Ai, sim.

22:53 R: Isso daí era o que eu gostava de cinema, não é que o cinema era um negócio só para mim. Eu tinha 12 anos de idade e eu fiz um projetorzinho de madeira.

23:10 P: Que legal. Você acha que assim… Com que idade, assim, você percebeu “nossa, eu gosto de cinema e quero isso pra minha vida”?

23:20 R: Eu já tinha perto de 12 anos, eu já tinha, porque na época, que eu tinha, vamos dizer, uns 16 anos, 17 anos, eu pedi pro meu pai comprar um projetor de 16 milímetros e eu ia para São Paulo para alugar filmes para fazer um contrato, vamos dizer, com a Paramount, com a Universal. E eles mandaram um filme de 16 milímetros. E nós via eles em casa… Meu pai gostava de assistir filmes de faroeste, tal. Então ficava em casa a família, alguns amigos, uns vizinhos e tal, e nós ficava exibindo um filme em casa, lá na Alferes, quando nós morava lá, onde seu pai nasceu.

24:02 P: E o vovô Luiz, ele tinha mais essa paixão pelo cinema ou ele tinha mais uma relação mais comercial mesmo, assim, como que era?

24:09 R: Quem? Quem, você diz?

24:10 P: Do vovô Luiz, do…

24:13 R: Ah não, ele gostava de cinema. De faroeste, principalmente, mas ele não tinha, era fazendeiro, não tinha… Ele gostava, eu nunca me esqueço, quando o Walt Disney morreu ele falou assim: “O mundo perdeu um grande homem”. Isso eu nunca me esqueço, viu, que ele falou. E a gente exibia muito os faroeste do John Wayne, essas coisas…ele gostava do John Wayne, mas não tinha nada, na família não tinha ninguém.

24:49 P: Era só você, assim?

24:50 R: Só. Pode ser que algum antepassado de uns 200 anos tinha algum que mexia com teatro…

25:00 P: Então, assim, essa ideia de começar a construir cinema na cidade… Foi, assim, nessas exibições que tinham na sua casa, ou… Foi mais pra frente? Assim, como surgiu a ideia de “ah, vou construir cinemas”, assim?

25:14 R: Não… Dessas exibições caseiras, vamos dizer, é… O primeiro contato que eu tive assim, vamos dizer, com o cinema mesmo foi na produção, em 54, de Os Três Garimpeiros.

25:36 P: Uhum.

25:37 R: Que tinha uma pessoa aqui em Piracicaba que sabia que eu gostava de cinema, me procurou, falaram “nós temo um diretor”… Que no tempo da Vera Cruz eles trouxeram para o Brasil uns dez diretores italianos. Onde produziram Sinhá Moça, O Cangaceiro, produziram bons filmes, assim, na Vera Cruz de São Paulo, né. E tinha um diretor chamado Gianni Pons, e ele… Veio ele, veio um cara de São Paulo que não me lembro o nome, e ia financiar o filme “Os três garimpeiros”. Me procuraram, tal, tudo bem, apresentei as pessoas de Piracicaba, que tinham dinheiro, tal, e eu fui assistente diretor do filme.

26:40 P: Ai, que legal!

26:41 R: E eu conheci… Tinha um diretor de fotografia, um francês, e tinha um fotógrafo inglês também que tava aqui. Não me lembro mais o nome dele, foi em 54, faz muito tempo. Mas aí começamos a fazer o filme, tudo. Aí eu… Fizemos uma reunião com o pessoal do Dedini, Arnaldo Ricciardi, tal, todo mundo para financiar porque acabou o dinheiro do rapaz de São Paulo. Aí eles toparam, falaram “Bom, vamo fazer o seguinte. Nós entramos, mas o diretor, que era o Gianni Pons, em vez de ele receber nesse momento, ele vai fazer parte do filme, no financeiro. O que render o filme, ele vai ficar com 20%”. Aí ele não topou, aí eles falaram “Então nós não entramos”. Aí eu acabei me desentendendo com o Gianni Pons, eu já tinha ajudado a montar inclusive o filme, nós ficávamos de noite…

27:59 P: Ah, já tava gravado o filme, assim?

28:00 R: Não.

28:03 P: Montar a decupagem, assim?

28:04 R: Chegamos quase no fim, mas aí ele ia montando, vamos dizer, não quando tava tudo filmado. Filmou, vamos dizer, 30 %. Vamos montar pra ver como ta essa parte. Chegava na moviola e punha ali, tal, cortava e montamos. Montamos parte do filme, né. Eu fui até aí, daí me desentendi com ele porque ele… Ele não tinha um roteiro… No fim, eu descobri que ele não era diretor de cinema.

28:40 P: Não? O que que ele era?

28:42 R: Ele queria, mas lá em Cinecittà, na Itália, ele só carregava rolo de filme de baixo pra cima.

28:49 P: Ai, meu deus!

28:51 R: Depois, quando [voltamo à] Roma Filmes, eu encontrei com ele em Roma, ele veio me cumprimentar, como se fosse “Poxa não devíamos ter brigado”. Mas brigamos, então perdeu uma amizade, né. Tanto que meu nome nem apareceu nem como assistente de nada no filme, ele tirou tudo. Daí eu comecei a me interessar de exibição, eu sempre gostei de exibição. Gostava. Eu fiz o filme de 16 milímetros aqui em 51, que eu era o cinegrafista, a minha irmã, a Tita, era a atriz e o meu tio Leonardo era ator… Um negócio de família, né, e… Eu tenho até hoje o filme, eu pus em CD.

29:55 P: Que legal.

29:56 R: Mas até mandei numa mostra em São Paulo e teve uma menção de honra. O que era muito complicado, você tinha que filmar, não tinha montagem, tinha como montar. Você tinha que filmar um roteiro em sequência direitinho, né, aí tinha que mandar para São Paulo para revelar, para depois você ver como é que ficou. E daí você só montava, só colava. E essa foi a primeira experiência como produtor de filme, além de filmar os filhos, essas coisas. Mas ainda era preto e branco, não tinha nem colorido.

30:39 P: Que legal.

30:40 R: Essa história é minha história de cinema.

30:42 P: Não, é uma história incrível, assim, nossa, do… Desse filme, assim, Os Três Garimpeiros assim, então nem tem onde assistir, assim, ele finalizou, como é que foi, assim, o final dessa história de Os Três Garimpeiros?

30:56 R: Foi assim o final dessa história. O filme tava indo bem, ó, tinha Milton Ribeiro, que tinha feito o cangaceiro. Tinha Alberto Rush, que era um bom ator, tinha a Aurora Duarte, que depois ficou muita amiga minha lá em São Paulo, tinha amizade com ela que era uma boa atriz. Tinha só gente boa. Esse diretor de fotografia, o cinegrafista… Muito bom… Uma equipe boa, mesmo. Só que o diretor era péssimo. Ele não tinha roteiro, ele chegava de manhã na… Na… Ali no… Tem um prédio hoje do lado do Colégio Piracicabano olhando de frente ali à direita tem um prédio. Ali era hotel José Orsini, e nós e o pessoal ficava ali. E de manhã nós chegava lá “que que nós vamos filmar hoje? Ah hoje nós vamos filmar isso.”

32:02 P: Meu Deus

32:03 R: No dia seguinte: " agora, vocês vai filmar aquela cena lá que era uma charrete, coisa e aí que eu vou fazer outra coisa e eu ia dirigir lá a cena da charrete". Então não tinha um roteiro. Tinha história, tal, mas não tinha uma decupagem, um roteiro definido pra você saber assim, assim, assim, vamos fazer isso, fazer aquilo. Então, era muito, muito, foi muito mal, o filme… Foi mal na exibição, ficou ruim no fim, mas enfim.

32:40 P: Tem onde assistir esse filme, assim, ou ele… Perdeu?

32:43 R: Não sei, eu não sei o que talvez ele tivesse cinemateca de São Paulo que pegou fogo. Não sei. Não sei se guardaram, não era coisa de guardar. Embora tivesse gente boa no meio, que esse pessoal que veio aqui, era gente da equipe que veio da Europa pra Vera Cruz de São Paulo. A Vera Cruz produziu bons filmes na época, muito bons filmes. Sinhá Moça era um deles, um grande filme. Tinha outros que eu não me lembro o nome, agora, assim, faz muito tempo, foi em cinquenta e um, cinquenta e dois. Foi assim que começou daí eu, eu sempre me interessei… Tinha o Arnaldo [Ricciardo], que era genro do Marco Vidimi, que era o mais rico de Piracicaba e ele gostava de cinema também e nós montamos uma… Uma produtora que chamava Águia Filmes. Esse nome fui eu que pus e eu era minha, né? Mas ele ficou “vamos fazendo, vamos fazer” e não fizeram nada!

34:06 P: O senhor só participou de produções assim, Os Três Garimpeiros, essa mais da… Da família, assim?

34:13 R: Só dois, esse filme caseiro de dezesseis milímetros e Os Três Garimpeiros, e daí saí dessa questão de fazer filme, porque… No Brasil não tinha… Não tinha como fazer, cinema na época era muito complicado, não era como hoje. Como hoje, nem se fala! Que nem cinema hoje, película hoje não existe mais, né?

34:41 P: Sim.

34:42 R: Na época cê tinha que mandar revelar e aí revelava em São Paulo, era muito difícil, não é? Num era fácil não.

34:49 P: E o que você acha do cinema de hoje em dia, assim? Você acha que hoje em dia o cinema está melhor assim? Como é que você acha que foi essa essa evolução, assim, do cinema?

34:59 R: Eu sou pessimista em relação ao cinema. Vamos dizer, sala de cinema. Não o cinema em si. Eu acho que o cinema em si vai continuar, mas vai continuar digital, continuar em streaming, em residência… Vamos dizer televisão, mas o cinema, exibição… É… Físico, eu acho que a tendência do cinema vai ser como o teatro.

35:28 P: Uhum. Ficar menor, assim, né?

35:31 R: Os teatros, raros teatros, porque… Um streaming, por exemplo, você… Atualmente eles tão lançando filme já no YouTube e no cinema junto. Às vezes antes, dependendo da qualidade do filme vem antes. Então, futuro do cinema… Eu não sou muito otimista, não. Cinema como era, o cinema…O prazer de entrar numa sala de cinema… Hoje você entra na sala de… Eu fui duas ou três vezes em cinema, só. Pessoal, com pipoca, joga no outro, fala… E… E eu tinha horror de entrar no cinema e alguém falar. Tinha que ser silêncio total.

36:24 P: É… Você acha que o cinema de rua ele tinha mais assim esse respeito ao filme do que o cinema atual, assim, de shopping, às vezes não tem muito, assim?

36:33 R: Bastante diferença. O cinema de rua… Tanto que na época eu tirei várias pessoas do cinema.

36:41 P: Por que falava?

36:43 R: Ah, tavam fazendo barulho, coisa assim. Eu chamava o Lanterninha e falava, “ah lá, tira aqueles dois, põe fora”. Quer dizer, cinema era um negócio sério.

36:54 P: Sim, tem que ter respeito ao filme que tá passando, né?

36:57 R: Exatamente, né? Hoje não, hoje…

37:02 P: Hoje acho que nem pode, acho, né?

37:04 R: Não, se fizer isso é preso.

37:07 P: Aham! E que sala de cinema você mais frequentava, assim? Tinha alguma sala que você ficava mais, assim, ou você ia bastante em todas?

37:16 R: No tempo da curta sobrevivência do Plaza, era onde eu mais ficava, né. No dia que caiu o cinema, eu estava lá, né.

37:26 P: Você estava lá dentro do cinema?

37:29 R: Tava. Eu e o seu avô.

37:31 P: E como é que vocês saíram?

37:33 R: Pela tubulação de ar condicionado, que era embaixo da sala de projeção, que era alto, né? Lá no fim tinha um quadrado, assim, e nós saímos por lá. Que o resto tinha destruído tudo.

37:47 P: Nossa, e como é que foi a sensação de estar em um prédio caindo?

37:50 R: Eu achei que ia morrer. O barulho foi tanto, a poeira foi tanta que morreu todo mundo… Morreram 57 pessoas, imagine.

38:00 P: Sim, nossa… Vocês estavam embaixo, assim, né? Nossa.

38:04 R: É. Salvaram-se meu pai, eu e um amigo meu que ia viajar no dia seguinte, agora à noite, ele foi lá pra nós combinar que eu ia levar ele em Viracopos.

38:14 P: Nossa!

38:15 R: Ele foi pros Estados Unidos, ele é professor de agronomia.

38:18 P: E você acha que esse foi, assim, é… Qual foi o momento mais marcante, assim, seu numa na sala de cinema, você acha que foi esse, assim, tá caindo o cinema?

38:28 R: R: Bom, esse foi a… Bom, a sala que eu mais frequentava, assim, que eu ia sempre foi o Rivoli, né.

38:37 P: Uhum, por que, assim?

38:39 R: Porque a reforma que foi feita… Ficou um cinema, vamos dizer assim, mais aconchegante, né. O Plaza tinha um sistema de som já estéreo, era um cinema muito avançado pra época, né? Mas durou pouco, só dois anos.

39:01 P: Aham, e aí… Mas o senhor ficava bastante no Plaza, assim, ou…?

39:08 R: Eu ficava lá direto, eu era o gerente do cinema, lá. Eu ficava Natal, primeiro do ano, tudo tava lá. Só ia pra casa depois que terminava a sessão.

39:23 P: E, assim, então, pra finalizar, assim, o que que você acha que o cinema trouxe pra sua vida, assim, você fala “nossa, foi o cinema que…”, “por causa do cinema que minha vida… Teve isso…” O que que você acha que o cinema trouxe pra você, assim?

39:37 R: Olha, a minha vida foi o cinema.

39:40 P: O cinema trouxe a sua vida?

39:43 R: Foi o amor da minha vida, sem ser a minha querida esposa aqui. Foi o cinema, assim, porque principalmente… Várias passagens, quando Hollywood quando lançaram Guerra nas Estrelas, o primeiro, lá, dando ainda aqueles cinemas com o som… Com faixa magnética, cinco faixas magnéticas… Eu ficava babando de ver aquilo. Então, foi… Sempre foi… Minha vida foi cinema, fora disso, eu não fiz outra coisa, eu só fiz cinema a vida inteira.

40:28 P: Ai, saiba que sua sobrinha é assim, também. Eu falo “cinema é a minha vida”, eu me identifico muito com a sua fala, assim, eu sou muito assim, também, desde criança, assim. É cinema! É cinema!

40:43 R: O cinema, ele tem mistério, é misterioso, e é tão gostoso você assistir um filme e perceber como é feito, aquilo eu me vejo do lado de cá, de dentro, vamos dizer, não na tela, do lado de quem tá filmando. Eu imagino a equipe atrás fazendo aquele filme, então… É gostoso. Eu não fiz outra coisa na vida, sabe, desde 1951.

40:20 P: Nossa! Ah, que bacana, nossa… Que incrível essa conversa. Ai, muito legal, ai, muito obrigada, Tio Chico, por…

41:34 R: Eu fico feliz que você que é a minha sobrinha gosta de cinema assim. Você é a única pessoa. Meus filhos não se interessaram, se meu filho Marcos gostasse de cinema eu teria ido mais longe, né, apesar que hoje teria acabado de qualquer maneira. Mas teria ido mais longe, bem mais longe. A Renata casou… Eu tive um videoclube, também.

42:00 P: Ah, é?

42:01 R: O primeiro videoclube, que se chamava “videoclube do Brasil”, foi aqui mesmo em Piracicaba, foi meu, a Renata que tomava conta.

42:09 P: E o que que vocês faziam nesse videoclube, assim?

42:11 R: Filme em VHS, alugava.

42:16 P: Ah, que legal! Entre si, assim. Ah, que legal!

42:22 R: Alugava filme. Você não lembra disso? Ah, não é do teu tempo, não.

42:26 P: Ah, eu, nossa, o VHS foi… Eu era muito pequena quando acabou.

42:32 R: Hoje não existe mais alugar filme VHS, nem existe mais o VHS!

42:37 P: É, VHS eu era muito pequena quando acabou, eu lembro quando tava entrando CD, assim, e eu era pequena.

42:45 R: Quer dizer, do cinema foi pro vídeo, também, né, simultaneamente. Lá quem tomava conta comigo era a Renata, a Edna também ajudava, fazia e tal, mas eu era mais cinema.

42:05 P: Uhum, e você prefere assistir um filme, tipo, por mais que hoje você vê filme mais em casa, você ainda prefere assistir um filme numa sala de cinema, você acha que é melhor, ou você já se acostumou a ver em casa, assim?

43:17 R: Não, eu gosto aqui em casa, porque eu tenho uma televisão de 75 polegadas, tenho um soundbar, então eu… Aqui em casa, eu… Bom, eu tenho 4 televisões aqui em casa, nós temos 4!

43:36 P: Nossa!

43:37 R: Uma na sala de jantar, outra na sala de televisão, no outro quarto e no outro quarto.

43:43 P: Então não falta lugar pra assistir filme?

43:47 R: Sai da sala de televisão, vai pro quarto e liga a televisão.

43:52 P: Ai, que bacana, nossa… Nossa, obrigada, Tio Chico, pela conversa.

43:58 R: Imagine!

43:59 P: Foi incrível, assim, nossa, to… To até emocionada, to até meio sem palavras.

44:05 R: Imagine, eu torço pra que você vá pra frente. Mas ó, vá pro caminho digital, viu?

44:11 P: Ah, é o que tá sendo, assim, de oportunidade.

44:15 R: É o futuro, esse é o futuro. Aliás, os projetores, hoje, todos, a maioria dos cinemas são tudo digital. Não tem mais película.

44:23 P: Sim, é, a película… Ta surgindo, assim, agora, dos estudantes de cinema, ta tendo uma moda, assim, de umas pessoas fazerem em película, mas é, assim… O vintage, como fala, assim, né, que uma galera…

44:39 R: Mas veja bem, o filme em película tem uma nitidez muito boa, mas o digital… O som digital é melhor. Embora os últimos filmes que eram feito em 70mm. Não sei se você sabia do 70mm,

45:00 P: Sim, sim.

45:01 R: Que é um filme de 35mm e o 70 que tinha 5 faixas magnéticas do lado.

45:07 P: Nossa!

45:10 R: Então ele tinha 5 canais de som.

45:15 P: Nossa, caramba!

45:17 R: E tinha também, no cine Palácio, quando eu comprei, tinha projeção em 3D.

45:25 P: Ah, é?

45:26 R: É, só que era um sistema, era diferente. Um projetor ali com o motor de um era ligado com outro através de um cabo, eles se movimentavam juntos e o filme era feito em duas filmagens, como se fosse o olho da gente, né, e projetava junto. E aí você usava o óculos… É… Como é que chama, o óculos… Esqueci o nome, um óculos especial, que você dava pra cada um que entrasse no cinema, pegava o óculos e assistia em 3D. Mas não durou muito o 3D, não, durou uns 2…

46:08 P: Por que?

46:10 R: Ah, porque era complicado. Quando, vamos dizer, quebrava um filme, por qualquer motivo você tinha que cortar, vamos dizer, 30cm, tinha que cortar o outro também, 30 cm, igualzinho. Porque tinha que ser exibido os dois ao mesmo tempo, né? Eram dois projetores, projetando o mesmo filme, em ângulos de filmagem diferente, né.

46:39 P: Então era até mais caro, também, para exibir o filme, né, porque precisava dos projetores…

46:42 R: Ah, era muito complicado! Então não era, hoje, por exemplo, você pega uma televisão 3D, você põe o óculos, você… Não interessa, é diferente, era outro sistema. Aquilo era uma coisa, assim, que durou muito pouco. Se durou 3 anos, foi muito.

47:01 P: Em que época surgiu esse 3d, assim?

47:03 R: 55, 56.. por aí.

47:08 P: Nossa, faz tempo, então.

47:11 R: Mais, é, faz, tem muito tempo. Tanto que logo depois que eu comprei o Palácio, nós… Daí pararam de fazer filme em 3D, né? Tinha que usar o óculos, depois você tinha que desinfetar o óculos, jogar fora. Porque cada um usava o óculos, depois deixava, aí vinha outro e se você tivesse problema no olho, passava pro outro.

47:37 P: Aham, tinha que deixar limpinho.

47:49 R: Era muito complicado.

47:43 P: Ai, nossa, Chico, eu acho que é… Eu acho que é isso.

47:49 R: Não tenho mais nada pra falar pra você.

47:51 P: Acho que já foi todas as perguntas, assim, que tava anotado aqui no canto.

47:55 R: Você tá muito bonita, Dara.

47:58 P: Ah, obrigada! Ai, espero aí que num futuro aí que melhorando essa questão de pandemia, né, dê aí pra gente se encontrar, né, e conversar, assim, só, né… Bater um papo, mesmo, assim.

48:12 R: Vamos, sim, um dia que você quiser, assim, depois que tiver tudo em ordem você vem aqui em casa, você… Eu… As fotografias eu mandei pra você, dos cinemas, tudo, né.

48:25 P: Sim, mandou, nossa…Você tem… Você tem mais fotos, assim, mais…

48:31 R: Olha, sinceramente, acho que eu mandei pra você todas que eu tinha, não me lembro, mas acho que eu não tenho mais nada, assim.

48:43 P: De rolo, assim, de filme, assim…

48:45 R: Não, não tenho mais. Nada, nada, nada. O que eu tinha, alguma coisa pequena, 16mm desmanchou tudo, estragou tudo, joguei tudo fora. Que quebrou, o celuloide vai quebrando, em si, ele quebra, né.

49:04 P: Sim, é, a preservação é difícil pra caramba, né.

48:06 R: É muito difícil.

47:08 E: Você conhece a objetiva para passar filme?

49:13 P: Não conheço, eu acho, objetiva?

49:16 R: Eu tenho duas objetivas aqui que eram do Cine Rivoli, acho.

49:21 P: Que legal!

49:22 R: A do Rivoli, sim, era duas objetivas espetaculares… Aliás, essa eu tenho aqui em casa na sala de televisão, eu tenho duas objetivas, ali.

49:35 P: Nossa, muito legal.

49:39 R: Ó, aqui era uma objetiva. Era assim de xenon. Ali uma… Dá pra ver bem, aí?

49:52 P: Ah, to, agora eu to vendo. Nossa, que bonita!

50:01 R: Isso daqui era uma objetiva do Cine Rivoli, porque ela é… Ela é… O Rivoli é muito, é comprido, né, então a objetiva de 4,53 polegadas. 2,115mm. Ela era novinha, assim, é [ ] nova, nova.

50:26 P: Aham. Nossa, que bonita.

50:30 R: Eu acho que comprei logo antes de fechar o cinema.

50:35 P: Ai, então foi usada muito pouco.

50:41 R: Foi… Se você olhar, agora… Eu podia até vender, mas hoje como as salas são pequenas, ela fecha muito o quadro, é pra sala grande, comprida, sabe? Ela abrir lado…

50:54 E: Agora é enfeite em casa!

50:56 R: Agora ficou enfeitando aqui em casa.

50:59 P: Ah, ela é um belo enfeite!

51:02 R: São duas, uma pra cada projetor.

51:05 P: Ai, eu também tenho umas câmeras antigas, assim, de fotografia, que eu uso mais pra enfeite, né, porque elas nem funcionam mais. Mas eu uso pra enfeitar! É tão bonito.

51:17 R: Eu tinha… É que a gente, quando é mais jovem, né, na época assim, não… Nunca pensei que… A gente não imaginava que a evolução ia ser tão rápida, né. Você não fazia muita questão de guardar certas coisas. A única coisa que eu guardei foi aqueles dois volumes de filme que são bem antigos, aqueles, viu.

51:39 P: É, são de quando?

51:41 R: Ah, aquilo lá eu acho que é de 46, 47… É dos primeiros que nós via em cinema.

51:51 P: Um dos primeiros que tinha, que teve. Nossa, que legal! É, foi muito rápida, né, essa evolução do cinema, ainda tá sendo, né, tá… Cada hora tá surgindo coisa.

52:00 R: Foram acho que uns 50 anos, né. Quase 50 anos de pouca evolução, mas quando apareceu a televisão, aí as coisas mudaram, né.

52:17 P: Você acha que o maior impacto pras salas de cinema foi a TV ou foi esses streamings que tão saindo, assim?

52:25 R: Não, teve…

52:26 P: Foi a TV?

52:27 R: Vamos ver… Tanto que na época que nós fomos comprar filme, tinha os distribuidores independentes, porque os americanos pararam… Não pararam totalmente mas diminuíram 50% a produção de filme pra fazer televisão.

52:47 P: Aham. Ah, sim, verdade.

52:49 R: E daí entrou italiano fazendo 600 filmes, a França fazendo 200, [aí enfim, tá]… Quando eles voltaram outra vez a fazer filme pra cinema e daí pra televisão, os outros… Hoje, da Itália acho que não fazem 100 filmes por ano.

53:07 P: Sim, diminuiu muito, né.

53:08 R: Não faz. E fazia 600, imagine o povo gravar 2 por dia!

53:14 P: É verdade!

53:15 R: Uma média de 2 por dia. Eu visitava [Ciniccitatti] e havia vários set filmando isso, filmando aquilo, tudo.

53:24 P: Muita gente, assim, né.

53:28 R: Estamos falados?

53:30 P: Estamos! Muito obrigada, muito obrigada Edna também que tá aí do lado.

53:36 R: Então tá bom. Quando você precisar, telefona que a gente, qualquer informação que eu tenha, que eu possa te ajudar, eu ajudo.

53:43 P: Ah, muito obrigada, pode deixar, qualquer coisa eu mando mensagem.

53:48 R: Manda um abraço pro teu pai, pra tua mãe… A sua irmã, onde tá?

53:53 P: A minha irmã tá aqui em Piracicaba, também. Mas ela tá fazendo faculdade em Foz do Iguaçu. Mas agora a gente tá…

54:00 R: Foz do Iguaçu?

54:01 P: Uhum, mas agora a gente tá aqui, né… Visitando os pais, né.

54:05 R: Mas você tá fazendo aonde? No Paraná, também, né?

54:07 P: É, eu faço em Curitiba.

54:09 R: Curitiba, né.

54:10 P: Cada um pra um canto.

54:12 E: Você é cinema, e ela?

54:15 P: Ela faz ciências políticas.

54:17 E: Ciências políticas? Legal!

54:19 P: É, ela gosta aí dessas coisas assim, de política, assim, né. Sociologia, filosofia…

54:27 R: Beleza! Foi um prazer bater um papo com você, Dara.

54:29 P: Ah, obrigada, foi um prazer!

54:30 R: Lembro de você pequenininha, na última vez que você veio aqui você tinha, né, 12 anos.

54:36 P: É, agora eu to com 20! Faz um tempo.

54:40 E: Ah, faz dez anos, hein!

54:42 P: Sim… Ah, mas muito obrigada, gente, um bom feriado pra vocês, aí, um bom dia.

54:47 R: Você também, um beijo!

54:48 P: Muito obrigada, um beijo e um abraço pra todos.

54:49 R: Dá um beijo na tua mãe, dá um beijo no teu pai.

54:51 P: Pode deixar, passo sim.

54:52 E: Brigada, uma beijo pra vocês todos.

54:54 P: Tchau.

54:55 R: Tchau.

54:56 E: Beijo, tchau!